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Fado e Poesia: 5 poemas que deram fados (mais um de presente)

Publicado por2022-01-06 por 9353
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Alguns poemas transformados em fados que se tornaram imortais.

Foto: Jimmy Baikovicius

Portugal é um país de poetas e muitos foram os que tiveram os seus poemas transformados em fados que se tornaram imortais. Vamos conhecer alguns exemplos pela voz de fadistas que tão bem os souberam interpretar.

Se poesia é música em palavras, o fado é a música que expressa de forma poética o espírito de uma nação sofrida, de gente sempre de partida para o mar ou para outro país a deixar as suas gentes para trás. A saudade, o mar e tudo o que os envolve são dois elementos fundamentais na construção poética do fado. O nosso primeiro exemplo mostra bem isso. 

“Fado Português” - José Régio, por Sara Correia 

José Régio nasceu e morreu em Vila do Conde e a sua proximidade com o mar e a comunidade que dele vivia serviram de génese a este poema que explica a origem do Fado: a omnipresença da tragédia marítima e o amor eterno a quem ficou na praia. 

Sara Correia canta este poema com todo o sentimento que merece.

O Fado nasceu um dia,

quando o vento mal bulia

e o céu o mar prolongava,

na amurada dum veleiro,

no peito dum marinheiro

que, estando triste, cantava,

que, estando triste, cantava.

 

Ai, que lindeza tamanha,

meu chão, meu monte, meu vale,

de folhas, flores, frutas de oiro,

vê se vês terras de Espanha,

areias de Portugal,

olhar ceguinho de choro.

 

Na boca dum marinheiro

do frágil barco veleiro,

morrendo a canção magoada,

diz o pungir dos desejos

do lábio a queimar de beijos

que beija o ar, e mais nada,

que beija o ar, e mais nada.

 

Mãe, adeus. Adeus, Maria.

Guarda bem no teu sentido

que aqui te faço uma jura:

que ou te levo à sacristia,

ou foi Deus que foi servido

dar-me no mar sepultura.

 

Ora eis que embora outro dia,

quando o vento nem bulia

e o céu o mar prolongava,

à proa de outro veleiro

velava outro marinheiro

que, estando triste, cantava,

que, estando triste, cantava.

 

Autopsicografia - Fernando Pessoa, por Mísia - 

O maior poeta do Portugal moderno é, sem dúvida, Fernando Pessoa e os seus vários desdobramentos. Fugindo um pouco à temática marítima, Pessoa aborda outro sentimento que é característico deste género: a dualidade do sofrimento. No Ffado, será de quem o canta e o finge, mas que realmente o sente para o poder cantar, e de quem o ouve, e que o sente como se fosse o seu.

O poeta é um fingidor

Finge tão completamente

Que chega a fingir que é dor

A dor que deveras sente.

 

E os que lêem o que escreve,

Na dor lida sentem bem,

Não as duas que ele teve,

Mas só a que eles não têm.

 

E assim nas calhas de roda

Gira, a entreter a razão,

Esse comboio de corda

Que se chama coração.

 

 

“Prece” -  Pedro Homem de Mello, por Amália Rodrigues

Os poema de Pedro Homem de Mello cantados por Amália ganharam toda uma força que nunca mais os podemos ler sem os cantar mentalmente como Amália os cantou: “Povo que lavas no rio”, “O rapaz da camisola verde”, “Havemos de ir a Viana” são alguns dos mais conhecidos e intemporais, mas o que apresentamos aqui é um exemplo de como o chão que pisamos enquanto crescemos fará sempre parte de nós. 

Talvez por isso este fado fez parte da banda sonora do filme “Gaiola Dourada”, onde a vontade de voltar ao país onde se nasceu é parte da intriga. 

'Gaivota' - Alexandre O'Neill, por Amália

Alexandre O’Neill é um dos mais originais e importantes poetas portugueses do século XX. Este poema é um exercício perfeito de conjugação entre a linguagem e ritmo modernos de O’Neill com a temática clássica do fado, particularmente o de Lisboa: o mar e o marinheiro, o amor e a despedida, que parece ser sempre a final.

Se uma gaivota viesse

trazer-me o céu de Lisboa

no desenho que fizesse,

nesse céu onde o olhar

é uma asa que não voa,

esmorece e cai no mar.

 

Que perfeito coração

no meu peito bateria,

meu amor na tua mão,

nessa mão onde cabia

perfeito o meu coração.

 

Se um português marinheiro,

dos sete mares andarilho,

fosse quem sabe o primeiro

a contar-me o que inventasse,

se um olhar de novo brilho

no meu olhar se enlaçasse.

 

Que perfeito coração

no meu peito bateria,

meu amor na tua mão,

nessa mão onde cabia

perfeito o meu coração.

 

Se ao dizer adeus à vida

as aves todas do céu,

me dessem na despedida

o teu olhar derradeiro,

esse olhar que era só teu,

amor que foste o primeiro.

 

Que perfeito coração

no meu peito morreria,

meu amor na tua mão,

nessa mão onde perfeito

bateu o meu coração.

 

“Barco Negro”  -  David Mourão-Ferreira por Mariza

David Mourão-Ferreira foi uma apaixonado pelo fado e escreveu uma obra poética imensa, alguma dedicada para a voz de Amália: “Espelho quebrado”, “Madrugada de Alfama” “Quando a noite vem”, são alguns dos poemas que foram feitos para serem cantados em fado. Um dos mais conhecidos é o Barco Negro, que vive da crença do regresso do amado. 

É, musicalmente, um fado atípico pelo uso de percussão para marcar o tema principal, como podemos ver aqui nesta interpretação de Mariza.

De manhã, que medo, que me achasses feia!                                    

Acordei, tremendo, deitada n’areia                        

Mas logo os teus olhos disseram que não,                                          

E o sol penetrou no meu coração.                                                 

 

Vi depois, numa rocha, uma cruz,           

E o teu barco negro dançava na luz                        

Vi teu braço acenando, entre as velas já soltas                 

Dizem as velhas da praia, que não voltas:                           

 

São loucas! São loucas!               

 

Eu sei, meu amor,          

Que nem chegaste a partir,        

Pois tudo, em meu redor,            

Me diz qu’estás sempre comigo.    

 

No vento que lança areia nos vidros;

Na água que canta, no fogo mortiço;

No calor do leito, nos bancos vazios;

Dentro do meu peito, estás sempre comigo.

 

Poema extra: “Os meus versos” - Florbela Espanca, por Kátia Guerreiro  

 



Florbela Espanca foi uma alma sofredora que verteu para a sua poesia todas as suas dores. A estrutura rítmica dos seus textos fazem com que tenham sido facilmente transpostos para canções e, naturalmente, para o fado.

Pelos 125 anos do nascimento da poetisa, foi editado um livro acompanhado de CD onde a sua obra e o fado enquanto expressão singular do povo português são expressos em toda a sua plenitude pela voz de algumas das mais importantes vozes femininas do fado e da música portuguesa contemporâneas. 

 

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Existem muitos outros poetas nacionais que tiveram as suas estrofes passadas para fado: Vasco Graça Moura, Camões, António Botto, Ary dos Santos, entre tantos outros. Se tiverem mais exemplos, partilhem-nos connosco nos comentários, gostaríamos de conhecer os vossos favoritos.

A dissertação de Yufei Li “Poemas para fado: alguns exemplos”, defendida na Universidade de Aveiro, explica as origens poéticas e musicais do fado e dá mais exemplos de poemas que passaram a fazer parte dos cânones da canção nacional.  Recomendamos a sua leitura a quem se interessa a fundo por estes temas.

Se em vez de ler preferirem tocar os temas de fado que apresentámos aqui (e mais alguns), recomendamos que visitem a nossa loja online. Vejam as guitarras portuguesas que temos para vocês fazerem música a partir da música das palavras.

 

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